Sobre impeachment, pressão popular e o perfil do Congresso

Por Pedro Fassoni Arruda

Sobre impeachment, pressão popular e o perfil do Congresso – por Pedro Fassoni Arruda

Compartilhe o conteúdo:

Compartilhe o conteúdo:

Imagem: reprodução da internet

1. Tenho lido e ouvido muitas pessoas dizerem que será difícil aprovar o impeachment de Bolsonaro, por conta da forte presença das forças conservadoras no Congresso Nacional. Muitas pessoas chegam até a justificar a atitude de Rodrigo Maia, dizendo que não adianta autorizar a abertura de um processo contra Bolsonaro porque não teríamos votos suficientes para aprovar a remoção do presidente.

2. Esse tipo de análise é extremamente limitada, mesmo para aqueles que se colocam na perspectiva institucional. Em primeiro lugar, porque sob a aparência de uma “análise realista”, pensa a correlação de forças como algo imutável, como se as alianças e compromissos não pudessem ser alterados pela própria dinâmica do jogo da política. Em segundo lugar, porque subentende que as decisões que são tomadas pelos representantes eleitos estão imunes às pressões da sociedade, às mudanças na economia, aos realinhamentos ocorrem dentro do próprio bloco no poder etc.

3. Correlação de forças não é algo como um quadro emoldurado na parede. Magalhães Pinto, um político conservador mineiro, já dizia: “Política é como nuvem. Você olha e ela está de um jeito. Olha de novo e ela já mudou”. Mas poderíamos acrescentar uma diferença: se não podemos controlar o vento e o formato das nuvens, o movimento da política depende fundamentalmente das ações humanas. Pode parecer uma constatação óbvia, mas infelizmente há muita gente repetindo até a exaustão que “Bolsonaro não vai cair, enquanto tivermos esse Congresso”.

4. Vou dar um exemplo de como isso não passa de um derrotismo fantasiado de “realismo político”. Em dezembro de 2015, a Câmara dos Deputados era presidida pelo bandido Eduardo Cunha, um gângster que comandava o maior esquema de corrupção no Congresso. Como forma de retaliação à presidenta Dilma e ao Partido dos Trabalhadores (que votou pela abertura de um processo contra Cunha no Conselho de Ética), ele autorizou um dos pedidos de impeachment que estavam guardados na sua gaveta. Alguns dias depois, o jornal Folha de S. Paulo divulgou uma enquete para mostrar que apenas 42% dos deputados declararam que votariam pelo impeachment (seriam necessários 2/3 dos votos, ou 66,6%). Estava claro que, se o pedido de impeachment fosse votado naquele momento, Dilma permaneceria no cargo.

5. A direita golpista tinha plena consciência de que não seria fácil derrubar uma presidenta reeleita com 54 milhões de votos, e que ainda contava com bastante apoio popular. O próprio PMDB de Eduardo Cunha e Michel Temer estava dividido, e muitos deputados do partido seguiam manifestando apoio à presidenta. Sabem o que eles fizeram? Arregaçaram as mangas e fizeram de tudo para inverter o placar. O Congresso entrou em recesso no final de dezembro, e enquanto isso a trama desenvolvia-se nos bastidores e nas ruas. Nos meses seguintes, desenvolveu-se uma guerra sem tréguas contra o governo, para desgastá-lo perante a opinião pública. Dilma foi perdendo popularidade, e muitos deputados acabaram mudando de lado por medo dos seus eleitores, já que muitos estavam preocupados com o seu futuro político.

6. Eles estavam certos? Óbvio que não. Impeachment sem crime de responsabilidade não tem outro nome: é golpe. Mas esse objetivo só foi alcançado porque eles sabiam que “correlação de forças” é apenas uma fotografia do momento, e que todo o cenário pode ser alterado (inclusive por quem faz o registro). O Congresso não é uma bolha isolada da sociedade, ele se parece muito mais com uma caixa de ressonância. Sindicatos de trabalhadores, associações patronais, movimentos sociais, partidos políticos, associações de classe, entre tantos outros agrupamentos coletivos, têm uma enorme capacidade de mobilização e pressão sobre os representantes eleitos.

7. Rodrigo Maia sabe que existem mais de 200 mil motivos para autorizar a abertura de processo de impeachment contra Bolsonaro. O argumento de que se deve “esperar” ter votos suficientes para fazer isso não é verdadeiro. O simples anúncio da abertura de um processo já seria suficiente para despertar as massas e acender a centelha que poderá transformar o governo em cinzas. O problema é que o projeto econômico de Maia é o mesmo de Bolsonaro, e precisamos denunciá-lo como cúmplice desse genocídio.

8. Bolsonaro será derrubado? O futuro está em aberto, tudo vai depender do que fizermos daqui para a frente. A luta será difícil, mas quanto mais lutarmos, mais fácil pode se tornar. Só não venha atrapalhar com seu derrotismo fajuto, embrulhado nesse pseudo-realismo. Se você quer derrubar Bolsonaro, lute para que isso aconteça.