Antes das urnas, a guerra

Por Felipe Demier; Charge de Iotti

Antes das urnas, a guerra – por Felipe Demier; Charge de Iotti

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Imagem: charge de Iotti

Creio que não passava na cabeça de ninguém da esquerda na Paris de 1943 a indagação acerca de quem deveriam ser os candidatos para um futuro pleito eleitoral após uma possível queda de Vichy. Lula, aliás, declarou que a pandemia no Brasil equivale a uma guerra, e nisso tem razão. Ocorre que, pela “força do hábito”, por assim dizer, porta-se como se estivéssemos em paz, e como se os ponteiros da história tivessem um belo dia estacionado no horário eleitoral pra de lá nunca mais sair.

Se há alguém por aqui que de fato confia nas instituições, mesmo que esta confiança não lhe seja de modo algum recíproca, e mesmo que estas mesmas instituições adulterem eleições, este alguém é Lula, para quem eleição, moderação e colaboração – mesmo com aqueles que podem, quem sabe, se desgarrar de Pétain – constituem uma espécie de panaceia para todo o mal, incluindo um genocídio. No ano que vem, Lula, com efeito, será o candidato de todos aqueles e aquelas que querem, de verdade, derrotar Bolsonaro, e assim o será porque muito provavelmente tratar-se-á de um pleito plebiscitário, a favor ou contra Bolsonaro, a favor ou contra o genocídio, e só Lula tem eleitoralmente chances de fazer as vezes do “contra”.

Mas não estamos no ano que vem. Não ainda. A luta é agora, e Bolsonaro tem que ser parado o quanto antes, pois com ele no poder as horas se medem em covas. Esperar, quieto, por uma redenção eleitoral, como fazem Lula e os dirigentes petistas, é assumir uma postura passiva diante da história, e o argumento de que o espaço para ação é pequeno minimiza, mas não elimina a responsabilidade dos grandes sujeitos políticos – sobretudo quando foram estes mesmos sujeitos que instilaram nas massas a noção de que votar é melhor do que lutar, e de que esperar é melhor do que transformar.

E a hora, agora, é de lutar, ao menos de tentar lutar. Não desistir, ao menos não sem tentar – já que, nesses tempos, o pra sempre de muita gente já acabou mesmo. Primeiro lutemos, e depois votemos. Assim, do ponto de vista tático, a crítica ao eleitoralismo de Lula e dos dirigentes petistas não pode ser feita antecipando, mesmo que “à esquerda”, o próprio debate eleitoral. Afinal, em meio ao um genocídio, a uma guerra, os socialistas deveriam se concentrar em lutar, e não em se pré-candidatar.