Neste contexto, quando o racismo religioso se exprime por meio de ataques às casas religiosas e a penalização jurídica dos praticantes do candomblé, lembrar a trajetória de Mãe Menininha do Gantois é extremamente significativo porque reverenciamos alguém que exerceu sua função valendo-se do diálogo, especialmente, o inter-religioso. Maria Escolástica Conceição Nazareth, Mãe Menininha, reinou como Iyálórìsà do Ilé Ìyá Omi Àṣẹ Iyamase, Gantois, em Salvador (BA). O terreiro de Oxóssi, teve como mãe a soberana filha de Oxum.
Foram 64 anos ininterruptos à frente do Ilé estando envolvida em diversas lutas pela legalização do candomblé, sendo uma das principais articuladoras sobre o término das restrições a cultos impostas pela Lei de Jogos e Costumes de 1930. Mãe Menininha foi como seu orixá: influente, poderosa, estrategista e inspiradora. Fez sua passagem em 13 de agosto de 1986, aos 92 anos.
Sua trajetória nos inspira a lutar e seguir na defesa das comunidades tradicionais de matriz africana. E é exatamente isso que tenho feito à frente da Mandata Quilombo. Durante toda a semana, por exemplo, estivemos focados em denunciar e escancarar o racismo religioso entorno do episódio de um terreiro em Araçatuba no qual uma mãe perdeu a guarda de filha após a adolescente passar por um ritual de iniciação no candomblé.
Em uma tradição com bases no matriarcado de mulheres negras é + ainda violento ver uma mãe que devota a sua fé em Orixá, inkice e vodun ter seu direito de transmissão de saberes ancestrais violados pelo Estado.
Junto à Mandata Quilombo, realizamos ações na Frente Parlamentar de Defesa da Liberdade Religiosa da Alesp, na Corregedoria do Tribunal de Justiça de SP, Ministério Público Estadual, na Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados e na Prefeitura Municipal de Araçatuba.
Mãe Menininha nos ensinou que o diálogo inter-religioso é quesito fundamental para uma sociedade mais justa e pautada no respeito e na elevação da dignidade humana. Façamos disso uma prática real do nosso cotidiano.
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Erica Malunguinho (Erica da Silva) (Recife, 20 de novembro de 1981) , é uma educadora, artista plástica e política brasileira, filiada ao Partido Socialismo e Liberdade (PSOL).
Em 2018, elegeu-se deputada estadual por São Paulo, sendo a primeira mulher transexual da Assembleia Legislativa de São Paulo.[1]Erica é mestra em estética e história da arte pela Universidade de São Paulo (USP) e criadora da Aparelha Luzia, um espaço para fomentar produções artísticas e intelectuais na capital paulista.[2]
VERBETE DA WIKIPEDIA
Conheça mais sobre a deputada e a mandata quilombola, por ela mesma.
Post Original:
Extra: Posts da Estante Viratual destacam literatura Nigeriana, obra de Maria de Jesus, Livros de Djamila Ribeiro e Silvio Almeida que estão entre os mais vendidos de julho e 10 autoras para ler em 2020:
EXTRA: A Mãe da Sabedoria – Blog Histórias do Povo Negro, por Agnes Mariano
Deve ter sido na beira de algum dos antigos córregos que atravessavam a cidade, talvez observando o líquido que jorrava de uma das dezenas de fontes de Salvador ou até sentada à beira do Dique do Tororó, que a jovem Maria Escolástica da Conceição Nazareth descobriu que, para ser uma pessoa honrada, justa e feliz, precisava apenas conduzir a sua vida da mesma forma que as águas buliçosas de um rio. Que deveria contornar os obstáculos no seu caminho com suavidade. Manter-se tranqüila mesmo frente às mais inesperadas correntezas. Que nunca devia desistir de ir em frente e seguir o seu caminho, mas sem pressa. E, principalmente, que deveria oferecer sempre o melhor de si a todos aqueles que a procurassem. Escolástica seguiu à risca esses princípios, trazendo assim tanta prosperidade à sua vida e à vida daqueles que a cercavam, que o seu nome correu o mundo. Homens e mulheres vieram de todas as partes para conhecê-la e tentar aprender como é que se faz para nunca deixar de ser límpida como uma menina, como ela, a Mãe Menininha que morava no Alto do Gantois.
AGNES MARIANO
Ela era filha de Oxum, a divindade que vive nas águas doces, controla a fecundidade e, portanto, a própria vida. Como sempre acontece com as filhas de Oxum, Mãe Menininha irradiava doçura e beleza, mas também conseguia equilibrar de uma forma perfeita a generosidade, sem deixar de ser enérgica, e a sabedoria, sem ser arrogante. Desde muito cedo ela entregou-se totalmente aos encantados e foi abençoada por eles. A sua neta Mônica Millet descreve um sonho recorrente durante a vida de Mãe Menininha do Gantois:
– Uma pequena garota de cabelos cacheados e loiros vinha chamá-la para brincar. Ela aceitava e as duas iam juntas para a praia. O o brinquedo era sempre o mesmo: os búzios. Acho que era a forma de Oxum, de Olodumaré transmitir a ela o conhecimento do jogo dos búzios.
Bisneta, sobrinha e filha de ialorixás, Mãe Menininha conduziu durante 64 anos os destinos do Gantois, que chegou a ser o terreiro de candomblé mais respeitado do país. Nascida no século XIX, ela cresceu entre os homens e mulheres africanas que criaram o candomblé no Brasil, aprendendo com eles os antigos costumes, os rituais e a língua iorubá. Precisou de coragem e diplomacia para fazer o seu terreiro sobreviver à perseguição policial aos cultos afros que vigorou até o início do século XX. Até que, gradativamente, viu a sua religião ser aceita e até despertar curiosidade entre pessoas de todos os cantos. A dificuldade, então, passou a ser continuar sendo receptiva com quem a procurasse, sem permitir a exploração do que, para ela, era sagrado.
Primeiro, Mãe Menininha encantava os olhos de quem se aproximasse dela com as suas cascatas de colares, batas bordadas e saias suntuosas, sentada num verdadeiro trono. Depois, acolhia o visitante com uma voz meiga e palavras gentis. Aos poucos, ia desfazendo todas as reservas que ainda houvesse, com seus conselhos sábios, tomando sempre o cuidado de amenizar o que pudesse assustar, de acrescentar esperança, de apresentar soluções. Presidentes da República, diplomatas, costureiras, artistas, intelectuais, médicos, padres, pais-de-santo, jornalistas, funcionários públicos, vendedores ambulantes e desempregados revezavam-se dia após dia aos pés da sua cama, de onde ela praticamente não saía nas últimas décadas da sua vida.