O golpe de 1964 foi gestado em longa conspiração civil que começou com a posse de Getúlio Vargas, em 1951, no contexto da guerra fria e da ocupação norte-americana dos espaços nacionais na América Latina.
O grupo de Castello Branco, que se apossou do poder formal (embora crescente pressão dos tropeiros que iriam formar a “linha dura”), tinha laços com a elite informada, principalmente por via de Roberto Campos, a que se atribui a manobra de criação do FGTS, fundo que receberia por décadas contribuições sem aposentadorias a pagar e, assim, financiaria o “milagre brasileiro” – ainda um projeto de base estatal, como previra Getúlio e Jânio continuara, ao fundar a Eletrobras.
O grande recuo, então, foi a exclusão dos trabalhadores que no modelo getulista, deveriam, associados à indústria nacional que se implantava, impedir a ocupação total do poder pelas oligarquias dominantes desde a queda do Império.
A repressão ao trabalhismo – o projeto de equilíbrio social implementado por Getúlio e que a propaganda americana, com desonestidade cultural típica daquele país, chamou de “comunismo” –, não impediu o surto nacionalista do governo Geisel, contra o qual se erguerem os antecedentes do atual bolsonarismo.
O golpe de 2016 também começou a ser tramado em 2003, quando naufragou a nave neoliberal de FHC. Agentes desembarcaram em bandos nos aeroportos (tantos conhecidos reapareceram!) e Joaquim Barbosa regeu o trabalho de minagem do governo com a tese ridícula do “domínio do fato” – como se alguém dominasse e respondesse criminalmente por uma estrutura do porte do Estado brasileiro”.
O objetivo, em 2016, não era mais construir coisa alguma, mas destruir e se apossar de tudo, dando curso ao suicídio nacional dos anos 90.
Um golpe, agora, seria apenas a satisfação de uma fantasia, como o cristianismo sem Cristo ou a democracia sem direitos. Na pior hipótese, uma sangueira tipo Suharto (1967), não no apogeu do império norte-americano, mas no que parece ser seu ocaso.
Não creio que a ideia prospere, exatamente por ser estéril e anacrônica em um país refém da banca, dominado, inerme e “essencialmente agrícola” como os oligarcas sempre quiseram.