1- A cúpula expressou um patamar superior de consenso discursivo sobre o aquecimento – sua existência e relação com emissões – e um aumento de convergência sobre as urgências das metas. Sob a direção Biden-Harris, secundada pela União Europeia, os governantes, vocalizaram o que já é a compreensão dos setores amplamente dominantes do capital: é preciso continuar a mudar a matriz energética e de forma rápida. Não deixa de ser uma vitória que o alerta de um punhado de ativistas “exagerados” de algumas décadas atrás tenha se tornado um padrão planetário oficialmente reconhecido.
2- Nenhuma ilusão pode ir além dessa constatação: os governos, de forma geral, sinalizam com “mudanças” que não mexam com as estruturas fundamentais do sistema econômico e que, de quebra, ainda abram novas janelas de valorização do capital e ainda de reequilíbrio estratégico em favor de um centro “limpo” e em detrimento de uma semiperiferia e periferias “sujas”. Seu slogan poderia ser “salvar o planeta …para os ricos”. Não devemos apostar no sucesso desta fórmula, não há indícios de que seja viável nem para os fins egoísticos – salvar alguns – a que se propõe.
3 – O discurso de Bolsonaro – absolutamente falso em relação a suas reais concepções, claro – reflete alguma fragilidade no plano internacional, em especial frente à mudança de comando dos EUA, mas também a pressão interna de elites econômicas financeiras, alinhadas à “transição” do capitalismo “verde” (capitalismo por dentro verde-dólar por fora).
4- Se há um aumento do consenso discursivo, há algo que não está nada resolvido: como será distribuída a “conta” dos ajustes. Os EUA vão querer exercer seu direito tradicional a não pagar nada. O discurso do “imperialismo ecológico” pode ganhar fôlego em outras partes. Bolsonaro e a extrema-direita em geral – aqui e em outras partes – podem estar num momento de recuo, inclusive sobre este tema (e há também já uma série de ensaios de discursos protofascistas de verniz verde, como sabemos) mas, como vão atender a suas bases econômica e ideologicamente a favor da espoliação e destruição mais descaradas?
5- A possibilidade da irrupção de novos surtos anti-ecológicos – ou ecocidas mesmo, de maneira subliminar ou explícita é – um risco real enquanto o poder mundial for dividido entre neoliberais cínicos o bastante pra se mostrarem preocupados com o meio ambiente e neofascistas falsos o bastante pra fingirem que concordam com eles pelo menos na superfície de alguns momentos.
O futuro e a vida são coisas grandes demais para estarem na mão deles, não?